Querido "dono",
Consegui que 
escrevessem esta carta por mim. Nem sabes a alegria que sinto por poder 
comunicar contigo. Todos os dias, desde aquele dia longínquo em que me 
colocaste a corrente no pescoço e me prendeste neste espaço, eu sonho 
que venha me visitar e fazer festinhas como me fazias quando eu era um 
bebê. Eu sonho que venhas conversar comigo, não entendo muito bem o que 
me dizes, mas nem imaginas como adoro ouvir o som da tua voz!
Eu sei que 
fiz algo de errado, senão certamente não me terias colocado aqui. 
Desculpa! Não quero ser exigente mas começa a doer ter esta corrente 
atada ao meu pescoço. Às vezes tenho o pescoço dormente, e outras vezes 
tenho muito comichão e nem consigo coçar! Sinto o seu peso todos os 
dias, o peso da solidão que me prende.
Tenho vontade
de esticar as pernas e correr...e como eu gostava de poder fazer isso 
contigo! Adorava que me atirasses umas bolas, aí eu podia mostrar-te 
como sou rápido a correr e como as trazia rapidamente. Gostava de poder 
ver o que tu vês, o mundo lá fora é muito grande? E existem outros como 
eu?
Ás vezes 
tenho sede e alguma fome mas eu aguento em silêncio porque sei que assim
que poder virá dar-me comida e água, sei que fazes o que podes, eu não 
quero incomodar, mas sabes, por vezes gostava de ter um pouco da tua 
companhia.
Sei que 
talvez alguém te tenha dito que eu não tenho sentimentos, mas olha que é
mentira! Nem imaginas quanta alegria sinto quando alguém me toca ou se 
dirige a mim. Nem sabes quanta tristeza e solidão pesa em mim nas longas
horas que não vejo ninguém. Nem sabes o medo que por vezes sinto no 
Inverno aqui sozinho, e tenho tanta vontade de estar perto de ti.
No outro dia 
passaram aqui umas pessoas estranhas e puseram-se a olhar cá para dentro
e a apontar para mim, riam e atiravam umas pedras na minha direção. 
Queriam vir fazer-te mal. Acertaram-me com uma na pata e ontem não 
consegui levantar-me , mas eu afuguentei-as logo com o meu ladrar. Eu 
não quero que ninguém te venha fazer mal…e não quero que te zangues 
comigo, eu prometo fazer melhor por ti.
Eu sou o teu 
amigo mais fiel, nunca te irei trair, não guardo rancor, e não tiro 
nunca o lugar de ninguém, será que tens mais amigos assim no teu mundo? 
Só queria um pouco mais da tua atenção e amor, uma cama quente no 
inverno, um local fresco no verão e o teu cheiro a entrar-me nas narinas
todos os dias, seguido de um sorriso e uma festa no meu velho lombo.
Eu sei que um
dia tu irás chegar aqui e tirar a corrente, e dar-me tudo isto, até lá 
eu fico quieto á espera. Só não demores muito meu "dono", porque estou a
ficar velho e começo a ver e ouvir mal. Faltam-me forças e não quero 
ir, sem viver um pouco contigo.
 
